Crescimento e desigualdade: cuidado, pois o PIB é o único indicador de prosperidade
O ritmo de crescimento da economia espanhola desde a saída da última grande crise, em 2014, tem sido admirado e até invejado pelos seus parceiros europeus. O PIB espanhol já acumula 25 trimestres consecutivos de avanço. E, embora seja verdade que o abrandamento que se alastra pelo Velho Continente prejudica a economia espanhola, também é verdade que continua a crescer acima da média europeia. O Gabinete de Estudos Económicos da Axesor prevê um avanço de 2% para o conjunto de 2019 e de 1,8% para 2020. Os números estão longe dos 3,8% que somou em 2015 e também dos 2,4% mais moderados com o que fechou 2018. Mas não é um avanço desprezível se comparado, por exemplo, com a situação na Alemanha, locomotiva do bloco, que está perigosamente à beira da recessão.
A prosperidade de um país não se mede, porém, apenas pelo seu PIB, mas também pelas desigualdades. E, apesar deste invejável compasso de crescimento desde a Grande Recessão, estes aumentaram em Espanha desde 2008. Mais de um em cada quatro espanhóis (26,1%) estava em 2018 em risco de pobreza e exclusão social, como recentemente destacou o Eurostat. São 2,3 pontos percentuais há mais de dez anos. Com 12,2 milhões de pessoas nesta situação, a Espanha é, juntamente com o Luxemburgo, a Grécia e a Estónia, um dos únicos quatro países em que o risco de exclusão aumentou nos últimos dez anos.
O desafio, portanto, é alcançar o crescimento inclusivo porque as vulnerabilidades pesam sobre o potencial de uma economia e o fazem não apenas em tempos de desaceleração como o atual, mas também em tempos de maior boom econômico. É algo que a Axesor Rating tem em mente nas suas classificações de crédito soberano. Na última revisão de Espanha, em outubro deste ano, avisamos que, “ao ritmo atual, será difícil cumprir a meta de reduzir a pobreza pela metade até 2030, pois Espanha se comprometeu em 2015 a aderir ao ano 2030 Agenda”, o plano de ação global da ONU baseado em 17 objetivos de desenvolvimento sustentável (ODS), tanto econômicos quanto ambientais, que visa garantir o progresso social e econômico sustentável.
Os desequilíbrios persistentes no sistema educacional espanhol não ajudam. O abandono escolar é elevado (17,9%) e a Espanha tem uma das taxas de emprego mais baixas para recém-licenciados da Europa: 75,4%. Contrasta, por exemplo, com 92,1% na Alemanha, e éclaramente uma ameaça ao crescimento futuro da economia espanhola devido ao seu impacto negativo na produtividade.
O elevado desemprego 14,5% no final de 2008) é outro dos grandes desafios, tanto pela sua proximidade ao nível estrutural, como pela sua elevada temporalidade, pela sua longa duração e pela sua incidência nos mais jovens. Foi, de facto,uma das principais causas do aumento das desigualdades sociais durante os anos de crise, daqueles de que falamos acima e que agora, dez anos depois, são mais disseminados do que em 2008.
Seria injusto, entretanto, não destacar que a Espanha tem trabalhado para cumprir os ODS. Devemos avaliar, por exemplo, a primeira emissão de obrigações verdes realizada pelo Instituto Oficial de Crédito no primeiro semestre de 2019 em 500 milhões de euros. Seguiram-se transmissões regionais, inclusive da Comunidade de Madrid.
O país já conta com um Alto Comissariado para a Agenda 2030 e um Conselho de Desenvolvimento Sustentável, além de uma Comissão Parlamentar para seu acompanhamento. Mas a instabilidade política que atravessa, em novembro serão realizadas as quartas eleições gerais em quatro anos, está a ter efeitos negativos: a Estratégia Espanhola de Desenvolvimento Sustentável e a aprovação da Lei de Mudanças Climáticas e Transição Ecológica ainda estão pendentes. E também faltam recursos para isso, que só podem ser previstos se forem aprovados novos Orçamentos Gerais do Estado, o que a fragmentação parlamentar impossibilitou em 2019.